quarta-feira, 5 de outubro de 2016

Viagem com a família!

Quanta mudança!

Poucas semanas separam o agora de quando eu estava no Caminho, mas parece que uma vida inteira já me distancia das experiências que eu tive na Espanha.

Primeira coisa, a rotina. Acordar, fazer xixi, escovar os dentes, enxugar a cara. Arrumar mochila, enrolar saco de dormir, calçar as botas.

ANDAR

Ficar um mês fazendo isso todos os dias faz a gente se desligar da realidade de uma vida com a qual nos acostumamos facilmente, como a rotina doméstica ou mesmo a que eu estou vivendo agora, a tal loucura de viagem. No Caminho sobrava tempo para contemplar, para deixar os pensamentos fluírem sem limite, sem pressa, um passo atrás do outro.

Daí acabou.

E foi bom, para ser sincero essa contemplação toda cansa. Acredito que as coisas precisam começar e precisam igualmente acabar. Ver as pessoas que vão e voltam pela trilha de Santiago me faz ver que é muito fácil deixar os problemas de lado, não pensar em nada e ligar no automático. Eu não quero isso para mim.

E então começou a viagem com a minha mãe. A primeira coisa que eu tenho que dizer é o quanto eu me sinto bem em Paris, como é bom saber que eu conheço melhor a cidade, que eu me viro com o transporte público, que não me sinto um turista bobalhão por lá. É bom saber falar a língua, entender as placas e me comunicar sem muito cansaço. Também é bom saber como gastar a grana, aprender a evitar as armadilhas de turistas e andar com calma pela cidade. Enquanto eu morava aqui na Europa eu nunca senti isso com cidade alguma, exceto Bruxelas. Porque nada era meu, nenhuma viagem era minha, nenhuma escolha era a minha escolha. Apagado, morto, indiferente. Parece cruel colocar dessa forma, mas era exatamente isso que eu sentia. Eu não era eu mesmo, não exercia minha personalidade, não escolhia nada. Por isso, para mim é como se eu estivesse abrindo meus olhos para os lugares lindos que teoricamente eu já conhecia, é como aprender a enxergar.

E eu aprendi também a não culpar, ninguém fechava meus olhos antes, era apenas eu que me recusava a abri-los. 

Amadurecer é aprender, e sinto que esses anos todos têm me ensinado bastante.

Sonhos são também invenções nossas. Eu inventei que queria passar meus 30 anos em Paris, no topo da torre Eiffel. Depois coloquei minha mãe na história, e no final esse desejo se realizou, nos meus 30 anos estava no topo da torre Eiffel com a pessoa que eu mais amo no mundo, agradecendo por todas as coisas incríveis que pude viver nessas três décadas. Foi legal e especial, mas apenas simbólico, assim como aprendi que o importante é o Caminho, também comecei a aprender que viver que é legal, fazer aniversário é só um detalhe.

Dos três namorados que eu tive, apenas um me felicitou, e de uma forma linda e carinhosa ainda por cima, como convém tratar alguém que foi especial na sua vida, pelos meus 30 anos. Tenho pensado muito nisso ultimamente. Quem eu valorizei, gostei e fiz questão de tratar bem até agora simplesmente me ignora numa data tão importante, é incapaz de se alegrar com minha felicidade, ou pelo menos ter a educação de me cumprimentar? É isso mesmo? Que lixo de gente que eu ponho em minha vida? A culpa é minha, é claro, por não enxergar quem realmente deve ser valorizado.

Pude aproveitar melhor Paris dessa vez do que no ano passado. Tive um pouco mais de tempo, e como fomos só em lugares que eu já conhecia, fiz tudo com calma e respeitei o ritmo da minha mãe. Em alguns lugares e momentos eu olhava para ela tão admirado, ela estava mesmo lá? É verdade que estávamos juntos em Paris, fazendo as coisas que eu gosto, mostrando para minha mãe como é um restaurante estrelado, que gosto tem um macaron da Ladurée? Não consegui deixar de pensar nenhum dia, até hoje, nos nossos piores momentos de pobreza, do pão velho frito no óleo por falta de manteiga, da venda das roupas por 20 reais para poder comprar comida, da ausência de ajuda de qualquer pessoa que se importasse conosco. Eu e minha mãe vencemos juntos, esse mérito é só nosso, essa conquista tem que ser celebrada todos os dias, nós demos a volta por cima, de cabeça erguida, sem pisar em ninguém, trabalhando e lutando.

Ir para Bruxelas com 4 dias inteiros para aproveitar a cidade também foi uma experiência muito mais gostosa do que o previsto. Me dei conta, ainda mais do que no ano passado, do quanto eu gosto de lá, do quanto eu me sinto muito à vontade, DO QUANTO EU LEMBRO DE TANTA COISA, TANTO LUGAR, TANTA RUA! As vezes pode parecer que um ano e meio é pouco tempo, ainda mais com tantas viagens no meio, eu mesmo pensava isso, mas eu vivi Bruxelas intensamente, conheci bastante a cidade, andei por muitos e muitos lugares, pude construir memórias bonitas por lá, e isso fica para sempre. Minha mãe adorou a cidade, e disse que é a sua favorita na minha escolha de lugar para morar. Acho que por enquanto ela também é a minha favorita. Mas será que eu conseguiria ser feliz em Bruxelas? Bom, tenho muito tempo para pensar nisso.

Outra boa surpresa está sendo Amsterdam. É a primeira vez que venho aqui desde que fui embora para o Brasil, e minhas memórias da cidade eram meio chatas, muitas construções iguais, muitos turistas e um clima terrível de frio. Uma cidade meio sem graça apesar da experiência bacana com os cogumelos. Pois bem, queimei a língua, a cidade é deliciosa. Mais uma vez considero que é a primeira vez que visito essa cidade do jeito que eu quero, e que isso faz toda a diferença. Chegamos ontem e meu irmão nos esperava na estação. Foi bonito ver o quanto minha mãe ficou feliz. Valeu a pena o esforço todo para fazer com que ele estivesse aqui conosco. Eles são minha família, cada dia entendo melhor isso. Eles são o que eu tenho que valorizar mais nesse mundo.

O clima aqui realmente é super, super frio, isso porque estamos no início do outono, mas agora eu sei me proteger melhor, ainda mais da idiotice de não ter agasalho decente no Caminho, e tenho conseguido me manter confortável mesmo na rua. O que é mais lindo aqui é a luz, refletida nos canais, iluminando as casas e as igrejas, batendo no sol rosto e ajudando a afastar o frio. É uma cidade onde todos sabem o quanto um bom sol é raro, e se esforçam para aproveitar cada raio dele. É também bem cara, acho que a mais cara das 3 cidades principais dessa viagem, mas meu orçamento ainda está tranquilo, então não tenho me exasperado muito com isso.

Já penso bastante nos próximos passos. Já comprei a passagem para a Turquia e para a Índia, e isso me deixou muito, muito animado! Parece que agora eu sinto mesmo que estou dando a volta ao mundo, e não apenas passeando pela Europa. Acho que semana que vem, quando eu estiver em Praga, que será um lugar novo para mim, já vou conseguir sair do automático e voltar a me surpreender com tudo! 

COMO É BOM VIAJAR!

LM



















Nenhum comentário:

Postar um comentário